Neste momento, governos federal, estaduais e municipais estão preparando o orçamento para 2018. Na Lei Orçamentária Anual, podemos ver como o Poder Executivo se prepara para arrecadar dinheiro e onde pretende gastar.
Queremos que qualquer pessoa tenha o poder de entender o que acontece com o dinheiro público. Já no fim de agosto, por exemplo, o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) não terá mais verba para financiar bolsas de pesquisa e projetos científicos pelo resto do ano. Para podermos discutir saídas e questionar o governo de forma efetiva, precisamos entender as regras do jogo.
Comunica estratégia de origem e destino do dinheiro público para os próximos 4 anos.
A cada 4 anos, o Poder Executivo elabora o Plano Plurianual (no jargão de Gestão Pública, PPA). Nele, é proposto o que será feito com o dinheiro público nos próximos 4 anos. Da mesma forma que uma empresa coloca no papel quanto acha que arrecadará e como usará esse dinheiro durante os meses seguintes, o governo também deve fazer. Várias perguntas devem ser consideradas: existe alguma dívida a ser paga durante esse período? Algum investimento a ser feito? Planeja dar aumento aos funcionários? Tudo isso é proposto pelo Executivo e aprovado — com ou sem modificações — pelo Legislativo. Uma vez aprovado, o plano volta para o chefe do Executivo para ser assinado.
Além de obrigar o governo a fazer esse planejamento no médio prazo, a Constituição Federal une gestões: o Plano Plurianual é feito no primeiro ano de mandato, definindo orçamento para os 3 anos restantes mais o primeiro ano do mandato seguinte. O que faz o Executivo não propor algo excelente para os 3 primeiros anos e algo ruim para o último, da gestão seguinte? Duas coisas, principalmente. A primeira é o objetivo dos grupos políticos de sempre permanecerem no poder para um outro mandato. Se reeleito, não seria interessante ter um orçamento prejudicado; a segunda é que a proposta é aprovada pelo Legislativo, composto por uma diversidade de partidos e interesses.
Dia 31 de agosto de 2015, a então chefe do Executivo, Dilma Rousseff, enviou o Projeto de Lei do Plano Plurianual para aprovação do Congresso Nacional.
Criado em conjunto com os ministérios, o projeto analisa o momento do país e planos de desenvolvimento para os anos seguintes.
Nas 205 páginas, em meio a vários índices econômicos e previsões e baseado na estratégia proposta no documento, temos um plano bem geral de quanto o país pretende arrecadar e como quer usar esse dinheiro. São estabelecidas metas de desenvolvimento para cada uma das áreas.
Na Saúde, o objetivo central é o fortalecimento do SUS e as metas envolvem a construção, ampliação e reforma da infraestrutura de 14 mil Unidades Básicas de Saúde (UBS); a avaliação e certificação da qualidade de 40 mil equipes de atenção básica; o incremento no número de médicos em regiões prioritárias do SUS, alcançando 20,3 mil médicos brasileiros e estrangeiros por meio do Programa Mais Médicos; o alcance de 38,5 mil bolsistas beneficiados pelo Pró- Residência; e a ampliação do número de equipes da Estratégia Saúde da Família para 46 mil.
O Plano Plurianual 2016–2019 fala dos motivos de continuar melhorando o SUS e de alcançar 14 mil Unidades Básicas de Saúde. Neste nível de planejamento, não é objeto de discussão muitos detalhes, como por exemplo a exata localização dessas unidades. Apenas pede autorização do Congresso para gastar uma determinada quantia, R$ 442 bilhões, do orçamento com programas relacionados a Saúde.
Depois de aprovado, este é um plano que deve ser seguido a risca. O Executivo se compromete a atingir as metas de receita para poder gastar com seus programas. Anualmente, a Presidência da República propõe versões mais específicas desse orçamento, limitando-se ao ano seguinte.
Aperfeiçoamento de metas do ano seguinte.
A apresentação de estratégia a médio prazo acontece apenas no início de mandatos do Executivo. No entanto, esse plano deve ser aperfeiçoado com frequência. Será que as metas do ano anterior foram atingidas? Como o Executivo pretende reajustar arrecadação e despesas, para assim conseguir completar todos os planos que pretendia na janela de 4 anos?
Por isso, anualmente, o Executivo aprova com o Legislativo o seu Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias. Uma vez aprovado, passa a receber o nome Lei de Diretrizes Orçamentárias (ou, no jargão, LDO). Esta, que deve seguir a estratégia de governo definida no Plano Plurianual vigente, vem para contar mais detalhes sobre o orçamento do ano seguinte.
Em 15 de abril de 2016, Dilma Rousseff apresentou ao Congresso Nacional o projeto de seu governo para as diretrizes do ano seguinte. Em 26 de dezembro, Michel Temer, que veio a se tornar o novo chefe do Executivo neste período, sancionou a Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2017 com modificações próprias e aprovação do Congresso. São 72 páginas, acompanhadas de 7 anexos. Em suma, apresenta justificativas para uma revisão de planos para 2017, incluindo estatísticas mais atualizadas.
Programas e respectivas metas para a gestão do ano seguinte.
Aqui o negócio é pra valer. O Executivo deve apresentar um plano concreto de como diminuir dívidas, aumentar a receita e “fazer o país crescer”, pela definição apresentada no Plano Plurianual e revisado pela Lei de Diretrizes Orçamentárias. Longe de ser conhecida popularmente, essa lei é encontrada em sites do governo pela sigla “LOA”.
Nesse momento, o Executivo reúne as necessidades de cada uma das áreas de sua gestão, como educação, saúde, segurança e transporte, produzindo um documento contendo os objetivos concretos do orçamento do ano seguinte.
No âmbito federal, a Presidência da República deve enviar seu Projeto de Lei Orçamentária Anual do ano seguinte para o Congresso Nacional até o dia 30 de setembro de cada ano. Como nas etapas anteriores, o Congresso também faz revisão e envia de volta ao Executivo para sanção presidencial.
Modificações feitas pelo Congresso
Câmara dos Deputados e Senado Federal devem apresentar sua versão da Lei Orçamentária até o início do recesso, antes de liberar os parlamentares para saírem de férias de fim de ano. Se isso não acontece até o dia 22 de dezembro? Duas possibilidades: presidências das casas legislativas convocam sessões extraordinárias, exigindo que os parlamentares permaneçam no Congresso até que o texto seja aprovado e enviado de volta, reduzindo assim os 50 dias de recesso; ou voltam a discutir o projeto apenas em fevereiro, quando devem voltar à Brasília.
Os responsáveis por essas mudanças em como o dinheiro da União pode ser gasto são 84 parlamentares, sendo 63 deputados federais e 21 senadores. Quando parte desse grupo, devem estudar, modificar e submeter o texto da Lei Orçamentária à aprovação do resto do Congresso.
Esse grupo, chamado de Comissão Mista de Planos, Orçamentos Públicos e Fiscalização (ou CMO), é definido em março de cada ano por votação interna. Já que nem todos parlamentares possuem conhecimento e experiência necessária para gerir o orçamento da União, recebem assessoramento técnico de servidores especializados do Congresso Nacional e do Tribunal de Contas da União. No período que a comissão produz o seu parecer, qualquer parlamentar pode enviar propostas de emendas para os pertencentes à comissão. Cada representante tem direito a um determinado número de adições ao orçamento anual:
Individual: até 25 emendas
Bancada: até 23 emendas
Comissão: até 8 emendas
Projeto de Lei de Crédito Adicional: até 10 emendas
Medida Provisória de Crédito Extraordinário: até 10 emendas
No dia 31 de agosto de 2016, a Presidência da República enviou seu Projeto de Lei Orçamentária Anual para o Congresso Nacional. Lá, depois de sofrer modificações, o Presidente da República em exercício e também Presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, finalmente aprovou com atraso (já em 11 de janeiro) o orçamento para o ano corrente.
A seguir, as despesas aprovadas para 2017. Para que conseguíssemos visualizar melhor, retiramos as duas áreas com mais despesas aprovadas para o ano: Encargos Financeiros da União, com R$ 863 bilhões, e o Ministério do Desenvolvimento Social e Agrário, com R$ 661 bilhões.
Essas regras são aplicáveis em cada uma das esferas da União, seja municipal, estadual ou federal. Enquanto você lê esse artigo, leis orçamentárias estão sendo discutidas e definidas. Emendas são feitas. Afetarão diretamente a habilidade do governo em tomar ações em benefício da população.
Um dos objetivos da Operação Serenata de Amor é permitir que pessoas sem qualquer conhecimento jurídico ou contábil possam entender o que acontece com o dinheiro público, se beneficiando de dados que apesar de públicos, são pouco acessíveis. Estivemos muito próximos de cotas parlamentares, algo que seguimos aperfeiçoando. No entanto, sentimos que introduzir conceitos relacionados ao orçamento pode expandir o horizonte de quem usa a Serenata como ferramenta de controle social.
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Originalmente publicado em medium.com/serenata em 8 de agosto de 2017.